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Descrição
8 de mar. de 2024
No final de janeiro, uma postagem feita por uma página portuguesa de conteúdos anti-imigração no X (antigo Twitter) denunciou a 💹 existência de uma placa de trânsito escrita em y betim “português brasileiro” em y betim Sintra, na área metropolitana de Lisboa.
“Sinal rodoviário 💹 escrito em y betim português brasileiro diz que é proibida a circulação excepto a ‘trens’ e bicicletas”, diz a postagem, que 💹 traz também uma
da placa que supostamente “assassina a língua de Camões que é o português europeu”.
O grande problema, 💹 segundo o autor do post, é que a palavra "trens" teria sido retirada do português usado no Brasil, já que 💹 em y betim Portugal o meio de transporte ferroviário é chamado de “comboio”.
O fato, porém, é que a palavra "trem" existe 💹 também no português europeu, mas com um significado distinto.
Em Portugal, pode ser “um carro de cavalos destinado ao transporte de 💹 pessoas”, ou uma carruagem, de acordo com a definição do dicionário da Porto Editora.
Levando em y betim conta a localização da 💹 placa, a palavra "trens" se refere às carruagens puxadas por cavalos que fazem passeios com turistas por Sintra.
O episódio faz 💹 eco a muitos outros casos de portugueses "puristas" que cada vez mais rejeitam a presença de vocabulários e construções brasileiras 💹 na língua falada em y betim seu país.
Esse repúdio fica claro em y betim muitas das reações às notícias e manchetes de 💹 jornal que denunciam há alguns anos a influência dos conteúdos produzidos por brasileiros nas redes sociais e no YouTube nas 💹 crianças e jovens portugueses.
Enquanto alguns veem a cobertura da imprensa como exagerada e apontam o peso da xenofobia nas visões 💹 propagadas, outros fazem coro às queixas e temem que a presença cada vez maior dos vocábulos importados seja sinal de 💹 um "apagamento" da cultura local.
Há ainda quem aponte o grande e crescente fluxo migratório - havia 360 mil brasileiros em 💹 y betim Portugal em y betim 2024, segundo o Itamaraty - como outro fator que contribui para isso.
Mas por que a possibilidade 💹 da variante usada no Brasil ser encontrada em y betim Portugal provoca tanta indignação entre alguns cidadãos? E qual a verdadeira 💹 extensão dessa influência?
Para Fernando Venâncio, linguista português que estuda o tema há décadas, há sim uma presença cada vez maior 💹 de traços importados do outro lado do Atlântico no idioma falado em y betim terras portuguesas. Mas isso não é novidade.
“Desde 💹 finais dos anos 1970 e princípios dos anos 1980, houve uma aquisição de brasileirismos gigantesca”, diz Venâncio, autor do livro 💹 O Português à Descoberta do Brasileiro.
Na época, isso foi um reflexo principalmente do sucesso das novelas brasileiras em y betim Portugal, 💹 explica o linguista. Agora, há um fenômeno novo em y betim curso, que envolve principalmente as crianças e adolescentes.
"Em Portugal, eles 💹 veem cada vez mais youtubers brasileiros, às vezes, por muitas horas”, diz Venâncio.
Podcast traz áudios com reportagens selecionadas.
Episódios
Fim do Podcast
A 💹 portuguesa Paula Lourenço é professora de escolas de ensino fundamental em y betim Sintra há 24 anos.
Ela dá aulas para crianças 💹 entre 9 e 10 anos e diz que o uso de expressões e palavras brasileiras pelos seus alunos é cada 💹 vez mais evidente.
“Neste momento, na escola, tenho um caso de um aluno que fala ‘brasileiro’ apesar de os pais serem 💹 portugueses”, conta.
A professora relata que esse aluno começou a ser vítima de uma espécie de bullying, com colegas implicando com 💹 a forma como ele fala.
"Por fim, descobrimos que ele ficava até altas horas da noite sem supervisão a ver
s, 💹 principalmente aqueles shorts [
s curtos] que são reproduzidos um atrás do outro.”
Segundo Paula, o gosto pelos
s produzidos por influenciadores 💹 e youtubers do Brasil é compartilhado por praticamente todos os seus alunos.
“Houve um boom principalmente durante a pandemia. Até eu 💹 já estou um pouco aficionada pelos youtubers brasileiros, porque comecei a ver para acompanhar o que meus alunos gostam”, diz 💹 a professora.
Mesmo nas aulas de inglês, a professora Teresa de Gruyter nota a repetição dos “brasileirismos”.
“Usamos muito a palavra ‘giro’ 💹 em y betim Portugal quando queremos falar de uma coisa que achamos engraçada ou interessante. Mas quase não ouço mais. Hoje 💹 em y betim dia, utiliza-se mais ‘é bonitinho’, que é muito mais brasileiro”, conta a portuguesa, que dá aulas principalmente para 💹 adolescentes em y betim uma escola de línguas em y betim Cascais.
Teresa nasceu em y betim Portugal e se mudou para a África 💹 do Sul na década de 1990.
“Quando saí do país há 25 anos, estávamos muitos expostos ao português brasileiro através das 💹 telenovelas e das músicas", diz.
"Mas, desde a minha volta há menos de 10 anos, começo a notar que todo este 💹 mundo dos youtubers e tiktokers [produtores de conteúdo da rede social TikTok] influenciam muito mais a maneira de estar e 💹 a maneira de falar das crianças no geral.”
"É exagero dizer que as crianças portuguesas passaram a falar ‘brasileiro’", diz linguista 💹 português
Graça Rio-Torto, professora de Linguística da Universidade de Coimbra, vê, no entanto, as novas construções e palavras aprendidas pelas crianças 💹 e jovens portugueses como aprendizados positivos.
“Essas palavras novas enriquecem o léxico dessas crianças e não há mal nenhum nisso”, diz 💹 ela.
"Mas se os pais portugueses têm preocupação com o fato dos seus filhos estarem a falar mais abrasileirado, lamento. Mas 💹 os responsáveis são eles. Não é tanto o contato com colegas brasileiros na escola que fazem com que elas falem 💹 assim, mas o número de horas que os pais permitem que elas fiquem na internet."
A professora Paula Lourenço concorda: “Essa 💹 influência é boa pelos conhecimentos que transmite na área no enriquecimento do vocabulário, da globalização e de conhecer outras culturas”.
“O 💹 problema são os casos extremos em y betim que já não sabem utilizar as expressões corretas nem no português do Brasil, 💹 nem de Portugal”, afirma Lourenço.
Para a professora, são o uso excessivo de telas sem supervisão e o isolamento das crianças 💹 e adolescentes que prejudicam o aprendizado e a compreensão de textos.
Venâncio diz que o fato de jovens portugueses usarem expressões 💹 brasileiras não deveria ser motivo de alarde.
“As crianças deixam sair uma ou outra palavra que ouviram no YouTube, mas é 💹 exagero dizer que passaram a falar ‘brasileiro’.”
Entre os destaques do YouTube que servem de referência para o sucesso brasileiro em 💹 y betim Portugal estão os canais dos irmãos Felipe e Luccas Neto, com respectivamente 46 e 42 milhões de inscritos.
Ao mesmo 💹 tempo, o canal de humor Porta dos Fundos atrai o público adulto português há alguns anos.
Para a linguista brasileira Jana 💹 Behling, doutoranda na Universidade de Coimbra que estuda o tema, o “impacto do brasileiro” também pode ser notado por meio 💹 da popularidade de cantores como Marília Mendonça e até da literatura produzida por autores contemporâneos, de Itamar Vieira Júnior a 💹 livros com conteúdo religioso.
“Coimbra é sempre mais conservadora, mas ainda assim desfila o ‘brasileiro’ no Poetry SLAM, que é 💹 uma competição em y betim que poetas leem ou recitam um trabalho original”, ressalta.
Crédito, Reprodução/X
Postagem nas redes sociais denunciou a existência 💹 de uma placa de trânsito escrita em y betim “português brasileiro” em y betim Sintra
Esse sucesso não acontece sem conflitos. Apesar dos 💹 consecutivos shows esgotados em y betim Portugal, Luccas Neto já foi repudiado por popularizar na fala portuguesa palavras brasileiras, como "geladeira" 💹 no lugar de "frigorífico", "ônibus" no lugar de "autocarro" e assim por diante.
“Alguns portugueses enxergam essa popularidade como se emporcalhasse 💹 a língua europeia”, avalia Behling.
“Isso sem falar nas gírias, típicas do despojamento de qualquer língua, mas que as xenofobias ainda 💹 olham com desdém.”
As professoras Paula Lourenço e Teresa de Gruyter afirmam ouvir com frequência reclamações de pais sobre as novas 💹 expressões adotadas pelos filhos.
“Alguns pais mais tradicionais reclamam ou corrigem os filhos quando os ouvem dizer palavras mais à brasileira”, 💹 diz de Gruyter.
“Mas tem outros pais que são bastante flexíveis, principalmente na zona do país onde eu vivo, em y betim 💹 que existem tantos estrangeiros”.
Lourenço acrescenta que, por outro lado, muitos pais não dão atenção a isso.
“As pessoas estão tão sobrecarregadas 💹 com o trabalho que deixam os filhos ficarem horas na frente das telas e não percebem como isso os está 💹 influenciando.”
Professoras portuguesas afirmam ouvir com frequência reclamações de pais sobre as novas expressões adotadas pelos filhos
O linguista Xoán Lagares, professor 💹 da Universidade Federal Fluminense (UFF), nota que ainda “há muito preconceito em y betim relação ao português do Brasil porque ele 💹 se diferencia em y betim muitos pontos, sobretudo na sintaxe do que é a tradição normativa portuguesa constituída em y betim Portugal”.
“Então, 💹 para muitos portugueses, as diferenças são identificadas como erros, como uma deturpação do português”.
Mas, segundo Lagares, especialista em y betim história 💹 social e cultural das línguas, não existe uma versão mais correta da língua.
“No caso do português, não há uma gramática 💹 oficial. Há uma tradição normativa que se manifesta em y betim gramáticas e dicionários”, explica.
Essa tradição temy betimorigem em y betim 💹 Portugal e foi elaborada a partir dos usos considerados de prestígio no país.
“O que aconteceu é que no Brasil foram 💹 se desenvolvendo outros usos de prestígio em y betim relação à gramática”, diz o professor.
Por isso, vigora hoje no Brasil uma 💹 tradição normativa autoral e interpretativa, que pode variar conforme a gramática e a visão dos seus autores.
Para alguns linguistas, as 💹 diferenças entre as variedades que se estabeleceram dos dois lados do Atlântico já são tão grandes que deveria haver uma 💹 separação definitiva entre o português e o brasileiro.
“Não dá mais para dizer que falamos português do Brasil”, opina a linguista 💹 Jana Behling.
“Dou aula de 'brasileiro' hoje em y betim dia, porque algumas pessoas acham o brasileiro mais fácil do que o 💹 português. Isso para mim indica uma ruptura.”
Xoán Lagares, porém, afirma que ainda é difícil falar em y betim suas línguas separadas.
“Em 💹 termos de descrição linguística, não há um critério para dizer em y betim que momento duas variantes se tornam línguas diferentes. 💹 Esse é um problema em y betim várias partes do mundo. Por isso, muitas vezes, é apenas uma questão política.”
Mas qual 💹 a real influência do português do Brasil em y betim Portugal, para além das críticas embutidas nas manchetes de jornais e 💹 dos "brasileirismos" denunciados nas redes sociais?
Segundo os especialistas consultados pela y betim News Brasil, é difícil prever o impacto que isso 💹 pode ter ao longo do tempo.
Até o momento, há poucas pesquisas publicadas que analisam o fenômeno – e novas expressões, 💹 palavras e estrangeirismos surgem e desaparecem nas línguas a todo tempo.
“Alguns youtubers brasileiros têm muita qualidade, e não é por 💹 acaso que as crianças assistem e também aprendem com eles”, diz Fernando Venâncio.
“Mas é impossível dizer se esse fenômeno novo 💹 vai ter futuro, porque também há alguns youtubers portugueses que estão a aprender bastante com os brasileiros e estão a 💹 produzir mais coisas com alguma qualidade.”
Para Xoán Lagares, a influência atual se dá sobretudo na sintaxe e a partir de 💹 algumas construções específicas. Ou seja, não engloba toda a língua.
“É difícil que eles mudem, por exemplo, a colocação pronominal por 💹 conta da forma usada no Brasil. Essas coisas demoram e são difíceis de acontecer”, diz.
“Veja no Brasil, onde ensinamos a 💹 questão da ênclise e até hoje não se consolidou, muitos alunos precisam ser corrigidos na escola e em y betim redações.”
O 💹 linguista afirma ainda que o próprio preconceito demonstrado por alguns portugueses em y betim relação à variedade brasileira deve barrar qualquer 💹 influência maior.
“Há muitas questões identitárias, de reconhecimento da própria variedade e de lealdade linguística envolvidas”, afirma.
Pory betimvez, a linguista 💹 Graça Rio-Torto avalia que o inglês exerça uma influência hoje mais forte em y betim Portugal do que o português falado 💹 no Brasil, sobretudo nas linguagens técnicas e da área de informática.
Ela é categórica ao afirmar que o português falado em 💹 y betim Portugal não sofrerá mudanças profundas e permanentes a partir dessa influência, ao menos por enquanto.
Para ilustrar seu argumento, ela 💹 ressalta que Portugal passou por séculos de dominação estrangeira e foi colonizado por árabes e espanhóis.
"Esses fatos tiveram alguma influência 💹 sobre a língua, mas não alteraram o rumo principal das mudanças linguísticas em y betim curso”, diz ela.
"Como linguistas, não esperaríamos 💹 que em y betim tão pouco tempo e em y betim um conjunto numericamente não tão significativo assim de falantes pudesse ter 💹 uma influência decisiva sobre a língua."
Havia essa mesma preocupação, segundo ela, nos anos 1970, quando as novelas brasileiras eram muito 💹 populares.
"Também se dizia que muitas construções lexicais e até gramaticais iriam ser introduzidas na variedade portuguesa. Mas não foi tanto 💹 assim", diz.
"É uma moda como outra qualquer, circunscrita no tempo."
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